T’lindeth
Descrita
por Ricardo Costa.
Baseada no jogo mestrado por Ricardo
Costa.
Personagens
principais da aventura:
Os
Humanos: Arthos Fogo Negro;Magnus de Helm; Sigel O'Blound
(Limiekki); Danicus Gaundeford; Klerf Maunader. Os
Elfos: Mikhail Velian; Kariel Elkandor. O Grimlock:
Loft Moft Toft Iskapoft. O Halfling: Bingo
Playamundo.
T’lindeth
Preparativos
para a Missão
A
nau voadora da Comitiva havia acabado de atravessar o
portal, localizado pelos luminosos Lina e Lino. Segundo
os mesmos, estavam agora próximos à cidade
drow de T’lindeth, centenas de quilômetros
ao sul da localidade anterior. Os aventureiros, com a
exceção de Limiekki e Iskapoft, encontravam-se
na cabine de comando. Storm e Danicus estudavam os mapas
da sacerdotisa Ki´willis. Arnylan, o elfo evereskano
piloto da nau, chamou seu conterrâneo clérigo
de Mystra, Mikhail Velian.
“Mikhail...
acredito que resolvi o problema sobre alguém mais
possuir o conhecimento necessário para manejar
a embarcação: enquanto vocês estavam
em missão e na semana dos reparos da nau, quando
você professava sua religião estrangeira
para aqueles imaskaris, ensinei ao jovem humano Klerf
os princípios de pilotagem desta nau. Ele ainda
deve aprender as manobras mais difíceis, mas acredito
que possa me substituir, se algo me acontecer.”
“Não
pense nisto, mas é sempre bom alguém que
possa lhe substituir, para que possa descansar.”
“Descansar...
não é necessário muito descanso.
Além do mais, é a minha missão! Vocês
arriscam a vida e eu apenas dirijo.”
“Também
corre riscos, como o ataque dos duergares! Por pouco não
se feriu gravemente!”.
“’Bem.
Meu risco é menor, então!”, concordou
o elfo. “Mas era isto que queria comunicar-lhe,
para evitar preocupações de sua parte.”
“Agradeço
por me informar!”, encerrou o clérigo.
“Companheiros!”,
disse Danicus, voltando-se para o grupo. “O portal
encontrado por Lina e Lino nos levou a uma região
registrada pelo mapa de Ki´willis. Estamos realmente
próximos de T’lindeth.”
“Sim! Sim! Eu
disse para vocês!”, comentou Lina, a pequena
moça de pele verde fluorescente, pupilas de gato
e cabelos e asas negros. “Mas vocês não
devem ir tão próximos da cidade. Eles possuem
montarias voadoras e podem ver o barco assim. Se forem
para lá, devem chegar a pé. Tem uma estrada
que leva até lá!”
“Então
é a hora de fazermos uma reunião. Vamos
repassar a todos o que temos de informação
sobre T’lindeth e traçaremos uma estratégia”,
decidiu Storm. “Klerf, chame os demais. Vamos a
sala de reuniões!”
Assim,
minutos depois, estavam todos os tripulantes, a exceção
do piloto Arnylan e de Limiekki, que vigiava o convés,
sentados em volta da maciça mesa de madeira, coberta
com um extenso mapa e várias anotações
manuscritas em dialeto drow.
“Meus
amigos da Comitiva...”, começou Storm, levantando
da cabeceira da mesa retangular. “Eu e o professor
Danicus extraímos as seguintes informações
das anotações de Ki´willis: T’lindeth
é um grande entreposto comercial e possui relacionamentos
com outras cidades drow, conhecidas como Ched Nasad e
Menzoberranzan. Também possui um reino na Superfície,
que lhe presta vassalagem.”
“É uma
colônia de drows na Superfície? Que reino
é este?”, quis saber Magnus.
“Não,
Magnus... não são drows. O nome do reino
é Dambrath e seus governantes são meio-drows.
Fica ao sul de Faerûn”, informou Danicus.
“Humm... já
ouvi falar... é perto de Luiren.”, falou
Bingo, o halfling.
“Pelo que lemos,
são quatro as principais Casas de T’lindeth:
A primeira Casa é a Barriervs, comandada pela matrona
Akoryna Barriervs, que também é a sacerdotisa
principal da igreja local de Lolth. A segunda Casa é
a Zaundar, de cuja matrona é Vassana Zaundar. A
terceira Casa é a Maet’tar, liderada por
Varlyna Maet’tar e a quarta é a Casa Do’ghym,
da matrona Darmia Do’ghym. A jóia foi entregue
pelos Millithor à segunda Casa, a Zaundar. É
lá que vocês devem se infiltrar”, explicou
Storm.
“Se a cidade
é um entreposto comercial, seremos menos notados”,
observou Mikhail.
“Aiaiai!”,
exclamou Lina. “Vocês vão entrar mesmo
naquela cidade drow? Cuidado... eles prendem pessoas e
fazem experiências. São muito malvados! Eu
não vou lá não!”
“Que é
isso, Lina!?”, rebateu o amigo luminoso. “Vamos
lá! Poderemos nos vingar deles, atear fogo nas
casas, fazer confusão... pode ser até divertido!”
“Vai ser perigoso!
Os drows podem pegar vocês!”, disse Arthos,
querendo amedrontar e se livrar da imprevisível
companhia dos luminosos.
“Ah! Vocês
nos protegem! Deixa a gente ir!”, insistiu Lino.
“Fiquem aqui.
Tomem conta do barco!”, sugeriu Bingo.
“Ficar aqui
é chato!”, respondeu Lina. “Lino...
porque não saímos por aí e procuramos
por portais? Pode ser divertido!”
“Isso! Façam
isto!”, falaram em conjunto vários membros
da Comitiva, felizes com a opção.
“Está
bem. Voltamos em um dia! Tchau!”, disse Lino.
“Tchau, Binguinho!”,
despediu-se Lina, voando em direção a Bingo
e apertando suas bochechas.
“Ei!”,
interrompeu Storm, antes que os agitados luminosos desaparecessem
de vista. “Podem
apontar no mapa o ponto onde está a estrada antes
de partirem?”
“Claro! Já
íamos esquecendo!”, falou Lino, tomando uma
pena sobre a mesa e assinalando um local no mapa estendido
na mesa. “Tchau! Até mais!”, disseram,
antes de saírem voando pela saída, rumo
a escada que levava ao convés.
“Tomem cuidado!”,
gritou Bingo.
“Pedirei a Arnylan
que deixe vocês na estrada. Ficarei apenas com ele
aqui na nau. O restante de vocês pode ir! Encerro
assim, nossa reunião. Relatem tudo a Limiekki.
Desejo-lhes boa sorte e que as bênçãos
de Mystra os acompanhem.”
E
assim a Comitiva deixou a sala de reuniões e os
heróis foram preparar seus pertences para a viagem.
Meia hora depois, Arnylan descia a nau, estendendo a prancha
de desembarque sobre a estrada indicada pelos luminosos.
O grupo dos nove desceu. Assumiriam agora novamente a
aparência e os nomes dos Millithor. Arthos seria
agora Torrellan; Magnus, Marckarius; Limiekki, Dariel
; Danicus, Glemoran, Mikhail, Narcélia; Kariel,
Karelist; Bingo, Quertus e Klerf seria Nef Millithor.
Iskapoft iria mesmo como grimlock que era, fazendo o papel
de escravo. Danicus conjurou duas magias e as aparências
se modificaram, completando o disfarce. Eram drows agora.
T’lindeth
Os
aventureiros percorriam uma estrada, claramente trabalhada,
pavimentada com grandes pedras arredondadas. Enquanto
andavam, conversavam.
“Passamos
por tanta coisa e nada de Torrelan! Onde será que
ele está?”, falou Arthos.
“Espero que
tenha batido em alguma rocha ou encontrado alguns daqueles
drows aranhas!”, desejou Klerf.
“Vamos pensar
em uma estratégia! Acho que devíamos nos
dividir. Um grupo poderia tentar entrar na Casa e um outro
poderia ficar como apoio, coletando informações”,
sugeriu Magnus.
“Acho uma boa
idéia!”, concordou Kariel. “Precisamos
saber quem irá com quem!”.
A
Comitiva debateu. O grupo que iria tentar a infiltração
na Casa Zaundar seria formado por Arthos, Limiekki, Mikhail,
Kariel e Klerf. O outro, que tentaria obter mais informações
do lado externo, seria composto por Magnus, Danicus, Bingo
e Iskapoft. Pensaram também em uma história:
os Millithor fariam uma inspeção na gema
mística, justificada por um defeito em jóias
instaladas em outras cidades.
Permaneceram
confabulando e caminhando, pela estrada escura, levemente
iluminada por cogumelos fluorescentes plantados nas suas
margens. Até que Mikhail ouviu então um
ruído que se aproximava e avisou aos companheiros.
De armas em punho, aguardaram. Próximo do limite
em que os olhos de drow podiam enxergar em meio a escuridão
da caverna, viram um imenso lagarto quadrúpede,
montado por três duergares e com alforjes lotados
de carga. Os anões das profundezas passaram por
eles, sem causar nenhum problema.
“Deviam ser mercadores ou coisa parecida!”,
comentou Limiekki.
Após a caminhada de quarenta minutos, avistaram
a entrada de T’lindeth. Era, na verdade, a boca
de uma imensa caverna, que fora fechada até a metade
por uma maciça muralha negra. Havia um gigantesco
portão, de madeira e aço também negros,
ladeados por duas grandes esculturas de aranhas. Também
havia guardas. Quatro drows guardavam o portão
e mais outros andavam de um lado para o outro no alto
da muralha, que também era guarnecida por balistas.
A Comitiva pode ver um barco voador, erguido por um balão,
atravessar a muralha, rumo as cavernas do exterior. Quando
se aproximavam, foram notados pelos sentinelas. Dois deles
se aproximaram e um bradou, firme:
“Alto! Em nome de Lolth, da Casa Barriervs e de
T’lindeth, Identifiquem-se!”.
“Sou Narcélia,
dos Millithor”, disse Mikhail, interpretando o seu
papel de sacerdotisa drow. “Temos negócios
em T’lindeth e precisamos entrar!”
“Senhora, não
sou eu quem decidirá isto, mas o meu capitão,
Baragh. Por favor, sigam-me. Os levarei até o posto
da guarda do portão. Lá poderão falar
com ele!”
O
drow, seguido pela Comitiva, andou a margem da muralha,
até uma pequena construção anexa
ao muro. Entrou por uma sala, onde pediu para que os recém
chegados aguardassem, e em seguida em um outro aposento.
Logo depois, ressurgiu pela porta e solicitou para que
a comitiva dos Millithor entrasse na sala. Um drow veterano
e robusto os aguardava, sentado atrás de uma mesa.
“Então...
quem são vocês e o que querem? Sou Baragh
Barriervs, capitão da guarda e dos sentinelas da
cidade.”
“Sou Nárcélia,
dos Millithor. Estou aqui para negócios com os
da Casa Zaundar.”
“Millithor...
é uma Casa menor de Menzoberranzan. Muito bem,
mas saiba que é meu dever fazer algumas perguntas.
Trazem dinheiro com vocês?”
“Sim. Mais do
que o suficiente. Cerca de dez mil peças”,
relatou Arthos.
“Estou vendo,
pela riqueza das suas armas e trajes que são drows
de posses. Não devem se incomodar em pagar uma
taxa de cinqüenta peças de ouro por cada um
que entrar!”
“Cinqüenta
peças de ouro!”, exclamou Kariel. “Sua
matrona e a matrona Vassana ficarão desapontados
se não pudermos negociar em T’lindeth por
não concordar com este pedágio absurdo.
Leve a mensagem a elas. Diga-lhes que os Millithor estão
aqui.”
Baragh
então refletiu. Não queria chamar a atenção
negativa das matronas. Então respondeu.
“Não
precisam recorrer às matronas! Está bem!
Podem passar! Porém, devo adverti-los das regras
da cidade para visitantes. Os únicos autorizados
a usar as insígnias de Casa dentro da área
comum da cidade são os da casa dominante, neste
caso a minha, a Barriervs. E todos os estrangeiros devem
trajar estes mantos, que devem ser entregues na saída”,
disse o drow, entregando capas de tecido púrpura
para os heróis disfarçados de drows. “Agora
podem ir. Sentinela! Leve estes senhores até a
entrada da cidade! Vão com as bênçãos
de Lolth!”
“Tome”,
disse Magnus, atirando uma pequena gema preciosa, “Isto
é para não dizer que somos sovinas!”
Baragh
segurou no ar a pedra, a colocou contra a luz de uma chama
mágica que iluminava seu escritório e a
guardou no bolso em seguida. A Comitiva foi levada à
frente do grande portão, que se abriu, revelando
T’lindeth. Era uma cidade de porte médio,
mas altamente movimentada. Além de drows, havia
muitos meio-drows, incomuns em outras cidades, mercadores
e visitantes duergares, além de uma grande quantidade
de escravos, humanos, bugbears, orcs e gnolls. Répteis
carregavam mercadorias e pessoas por toda à parte.
Um drow passou voando, montado em um inseto alado gigante.
Uma estrada cortava a cidade, para se perder, caverna
adentro, muito além de seus limites.
Andaram
na direção onde o fluxo de pessoas era maior
e chegaram em uma grande praça. Lá haviam
centenas de barracas armadas. Percorreram as ruelas entre
os pontos de venda de comerciantes drows, meio-drows e
duergares, que negociavam toda a sorte de produtos: de
cogumelos, utensílios, componentes para magia a
escravos.
“Senhores
visitantes!”, chamou um meio-drow a atenção.
“Vejam que linda peça de arte de Halruaa!
Sei que devem ter vindo de longe e não vão
perder a chance de adquirir esta e outras mercadorias
aqui em minha tenda!”.
“Onde consegue
estas coisas?”, perguntou Klerf, examinando um vaso.
“Halruaa! Fazemos
algumas caravanas à Superfície de tempos
em tempos”, respondeu.
“Somos recém
chegados e procuramos uma taverna, onde possamos comer
e descansar”, interveio Magnus. “Sabe onde
encontramos uma?”.
“Sim”,
disse o comerciante. “Para beber, existe a Tarântula.
Não sei se é adequada para senhores drows
distintos como vocês, mas é lá que
bebemos. O vinho não é misturado com água!
Mas, se preferirem descansar, recomendo a Aranha Devoradora,
do outro lado da praça. Existem acomodações
adequadas para drows”.
“E esta estrada
que corta a cidade?”, quis saber Kariel. “Onde
leva?”.
“Vai até
Dambrath, na Superfície. Eu nasci por lá”.
“Quanto tempo
leva para chegarmos na Superfície?”.
“Seis horas,
se for montado em um lagarto. Mas, meus senhores, seu
servo aqui lhes deu tantas informações...
não vão comprar nada? Veja esta bela escultura!”,
disse mostrando uma pantera negra, esculpida em pedra.
“É de um belo e feroz animal da superfície!”.
“Quanto custa?”,
perguntou Magnus.
“Custaria trinta
peças de ouro, mas para vocês, que são
tão agradáveis, serão apenas quinze
peças!”, disse o meio-drow, que havia comprado
a estátua de um artesão halruaano por cinco
peças.
“Feito! Obrigado
pelas informações!”, agradeceu Kariel,
dando as moedas ao satisfeito comerciante.
Terminado
o diálogo, decidiram os heróis irem até
a Aranha Devoradora. Estabeleceriam-se lá, e depois
rumariam em busca da Casa Zaundar. Atravessaram a movimentada
praça e avistaram o edifício assemelhado
a uma larga estalagmite, que parecia possuir quatro pavimentos.
O nome do estabelecimento estava escrito em uma placa
de pedra, fixada acima da porta. Ao entrar, viram que
o pavimento térreo era dedicado a uma freqüentada
taverna, onde muitos drows e meio-drows bebiam. Arthos
chamou um meio drow baixo e levemente barrigudo, que estava
no balcão.
“Queremos
quartos adequados para drows. Meu grupo possui oito integrantes
e um escravo!”.
“Sim, senhor!
Conversarei com minha senhora e providenciaremos quartos!
Peço que aguardem, por gentileza!”
Alguns
momentos depois, veio junto ao atendente uma drow, de
cabelos lisos, prateados e longos, trajada em um revelador
vestido azulado.
“Senhores, meu nome é Sérnia e sou
a proprietária. Tenho quartos especiais que não
alugo para não drows. Só gostaria de dizer
que aqui prezamos pela discrição. Não
queremos saber o que vieram fazer aqui ou a qual Casa
servem. Gostaríamos de nos manter fora de intrigas
e guerra entre Casas. Basta que paguem pelas acomodações,
que custam cinco peças. Espero que compreendam.”
“Não
se preocupe. Meu nome é Narcélia e apreciamos
também a discrição!”.
“Ótimo.
Então meu empregado irá mostrar-lhes os
quartos!”, disse a mulher, que se retirou em seguida,
para o interior de sua hospedaria.
O
meio-drow conduziu a Comitiva por uma escada em espiral.
Passaram por um, por dois até chegar ao terceiro
andar, o mais luxuoso e decorado de todos. Mikhail foi
conduzido até um quarto individual e os demais
a um coletivo, todos muito confortáveis. Mikhail,
porém, permaneceu com os seus companheiros. Precisavam
conversar. Kariel, antes, promoveu uma varredura, em busca
de magias de espionagem. Nada encontrou.
“Parece
que não existem magias de observação
ativas no quarto. Os mantos de estrangeiros também
não são mágicos. Acho que podemos
conversar!”, disse o mago.
“Temos que localizar
a Casa Zaundar e, se possível, algum contato do
Fogo Lunar”, disse Arthos. “A propósito...
quem está com o colar com o símbolo do Fogo
Lunar? Não devíamos deixá-lo a mostra?”.
“Eu estou com
ele, Arthos!”, informou Kariel, exibindo o item.
“Porém acho que devemos mantê-lo oculto”.
“Concordo com
Kariel”, complementou Magnus. “Não
sabemos que tipo de inimigos eles têm por aqui e
se conhecem o símbolo”.
“Certo. Mas
não vamos perder tempo. Vamos então executar
o plano e nos dividirmos. Eu, Arthos, Limiekki, Kariel
e Klerf vamos procurar a Casa Zaundar. Os demais vêem
o que conseguem extrair de informação útil
na cidade”, colocou Mikhail.
“Gostaria de
ir à taverna Tarântula, a que se referiu
o vendedor! Podemos ouvir o que se fala nesta cidade”,
sugeriu Magnus.
“Irei com você,
paladino!”, ofereceu-se Danicus.
“E eu também!”,
completou Bingo.
Assim, os oito desceram os degraus da estalagem. Iskapoft
ficaria no aposento rústico, dedicados aos escravos.
Mais uma vez encontraram o meio-drow serviçal.
Kariel pediu-lhe informações sobre a localização
da Casa Zaundar e foi atendido. Em seguida, foram porta
afora, dividindo-se nas ruas da cidade.
A Casa Zaundar
Os
cinco da Comitiva encontraram, alguns metros além
do alto relógio de fogo que marcava o tempo para
aos drows, um amplo feudo murado. Margearam o muro até
encontrar um portão, protegido por uma guarnição
de cinco sentinelas. Aproximaram-se e, de imediato, um
dos drows, de espada nas mãos, se dirigiu a eles.
“Quem
são vocês? O que desejam aqui?”
“Esta é
a Casa Zaundar?”, perguntou Arthos.
“Sim! Quem deseja
saber?”, retrucou o guarda.
“Sou Torrelan
Millithor e esta é a sacerdotisa Narcélia.
Nós temos negócios com a Casa Zaundar e
viemos falar com a matrona Vassana Zaundar!”
“Aguardem. Vou
transmitir a mensagem de vocês à Casa.”,
disse o drow, que executou uma série coordenada
e rápida de batidas no portão, que se abriu.
Ele entrou, ao mesmo tempo que mais cinco guardas saíram
para reforçar a segurança.
Levou
mais ou menos meia hora, até que o soldado voltasse.
“A
sacerdotisa Telabrina, que está substituindo a
Matrona Vassana na liderança da Casa, disse que
irá recebê-los. Irei conduzi-los a presença
dela. Sigam-me.”
Assim
fez a Comitiva. Seguiu o soldado, que ia com mais quatro
de seus pares, e entraram no feudo dos Zaundar. Era um
terreno grande e árido, com construções
esparsas. Quatro torres se destacavam, similares a enormes
estalagmites negras, com uma ou outra janela que deixava
passar a iluminação púrpura da luz
mágica usada pelos drows. Foram conduzidos até
uma das torres e, após adentrar um salão
amplo, subiram três lances de escadas, até
surgirem em um corredor ladeado de portas. No final deles,
uma era bem guardada por seis soldados. O sentinela abriu-a
e convidou a Comitiva a entrar. Dentro dela, havia uma
drow jovem sentada em um trono, ladeada por um drow de
trajes de mago e de um guerreiro, que parecia poderoso
e experiente. Também havia muitos guardas, cerca
de oito, de prontidão no salão. A mulher
começou a falar:
“Saudações,
membros da Casa Milithor. Para aqueles que não
estiveram aqui da última vez, eu sou Talabrina
Zaundar, segunda sacerdotisa da Casa. Estes são
Triss’nolu, nosso Mestre das Armas e Irae Gul, o
Mago da Casa. Lamento minha mãe não estar
aqui para recebê-los. Ela somente deverá
retornar pela manhã, por conta de um compromisso
em Dambrath. A visita de vocês foi inesperada. Algum
problema com nossos negócios?”.
“Senhora...
o motivo de nossa vinda foi o de verificar a integridade
a jóia que está em posse de sua Casa”,
respondeu Mikhail, agindo como a Sacerdotisa Narcélia.
“Porque? O que
houve? Ela está bem guardada!”.
“Houve uma falha
na pedra de Maerymidra e nós estamos verificando
as demais, para nos certificarmos que o plano funcionará
a contento”.
“Infelizmente,
sacerdotisa Narcélia, não posso mostrar-lhe
a pedra hoje. Somente minha mãe possui acesso à
sala do tesouro, onde se encontra a jóia e o portal
de pedra onde ela deverá ser fixada. Somente ela
pode desativar todas as proteções e mecanismos
que a guardam”.
“Então
poderemos retornar aqui amanhã!”, respondeu
Mikhail.
“Não.
Não precisam! Podem ficar como hóspedes.
São aliados de nossa Casa. Seria uma honra tê-los
aqui. Seria isto que minha mãe desejaria que fizessem!”
Discretamente,
o Mestre das Armas acenou para Arthos, ou melhor, Torrelan,
como se fossem conhecidos. O espadachim devolveu o cumprimento,
meio sem jeito.
“Está
bem. Aceitaremos seu oferecimento!”, disse Mikhail.
“Excelente!
Mas antes de levá-los aos seus aposentos, preciso
falar-lhe em particular, sacerdotisa Narcélia!”
“É claro!”
Telabrina
acenou e todos os outros drows deixaram o aposento. Mikhail
fez o mesmo e a Comitiva se retirou.
“Senhora
Narcélia... por onde vocês estiveram antes
daqui?”.
“Em Maerymidra
e em Undrek’Thoz!”.
“Notou alguma
coisa estranha com as bênçãos de nossa
deusa?”.
“Sim. A deusa
não nos responde. Acredito que isto tenha sido
a causa de uma rebelião em Maerymidra!”.
“Por aqui também
temos este temor. Minha mãe e algumas representantes
das Casas, foram até Dambrath para requisitar um
exército de meio-elfos para reforçar o contingente
a serviço da igreja de Lolth”.
“E estes mestiços
não podem também se rebelar contra as sacerdotisas?”.
“Acredito que
não, senhora Narcélia. Não teriam
nada a ganhar com isto. E seremos nós que pagaremos
o soldo. Agora peço-lhe que guarde esta informação
sobre o silêncio da deusa em sigilo. Nem os seus
próprios companheiros de Casa podem saber!”.
“Está
certo. Compreendo completamente!”, disse Mikhail.
“Existe algo
menos sombrio a comunicar. As Casas realizarão
jogos em homenagem a Lolth, como forma de desagravo e
para obter novamente seu favor. Haverá disputas
de esgrima, combate, magia, arquearia e luta. Vocês
podem participar e assistir se desejarem! Por favor, convide
os seus colegas”.
“Assim o farei!
Ficaremos honrados em participar!”, respondeu Mikhail.
“Está
certo!”, disse Telabrina, que tomou um pequeno sino
que havia em uma mesinha próximo ao trono e o tocou.
Rapidamente, adentrou um soldado.
“Leve os Millithor
para o aposento de hóspedes!”, comandou a
sacerdotisa.
Enquanto
isso, do lado de fora, Triss’nolu conversava satisfeito
com o Arthos disfarçado de Torrelan. O espadachim
da Comitiva sentia-se perdido. Torrelan parecia ser um
velho amigo do Mestre das Armas e ele lhe falava coisas
das quais nada sabia.
“Torrelan...
Quanto tempo se passou desde que veio aqui! Cadê
aquele chapeuzinho ridículo que você usava?”,
disse sorrindo o drow.
“Eu o perdi,
mas vou arrumar outro. Não é ridículo,
meu caro! É uma questão de estilo. Você
não entenderia!”, disse Arthos.
“Terá
que me contar suas aventuras, meu amigo!”, disse
o robusto drow, batendo-lhe no ombro. “Vamos beber
um vinho daqui a pouco, naquela estalagem. Pode me contar
de novo aquela história do drow com um bandolim,
lá em Menzoberranzan!”.
“Não...
aquela história está ultrapassada... tenho
outras novas!”, respondeu Arthos, desviando-se do
assunto. “Mas de que estalagem você fala mesmo?”.
“Da Aranha Devoradora!
Aquela onde encontramos a meia-drow, lembra-se?”.
“Ah... sim...
lembro-me!”, disse, mentindo. “Vamos lá!”.
“Está
certo! Pode chamar os seus amigos! Encontrarei vocês
para irmos juntos!”.
Neste
momento, a porta se abriu e saíram Mikhail e um
soldado. Triss’nolu imediatamente encerrou a conversa,
adotando uma postura mais formal. Ele acompanhou, juntamente
com dois soldados, os Millithor até os seus aposentos.
Conforme o padrão, um quarto individual para a
sacerdotisa e outro coletivo para sua comitiva do sexo
masculino.
Mikhail
entrou no seu aposento, mas logo depois saiu para conversar
com os demais e trocar informações. Limiekki
e Kariel fizeram uma busca por magia e escutas, mas nada
encontraram. Então, o elfo dourado clérigo
de Mystra pode contar-lhes sobre a preocupação
dos drows com o silêncio da sua deusa e também
dos jogos.
“Será
bom participar destes jogos, para não levantarmos
suspeitas e adquirir um pouco de confiança da Casa.
Mas alguns de nós deverão ficar aqui neste
período para tentar recuperar a jóia.”,
disse Arthos.
“Temos que arrumar
uma maneira de entrar na tal sala do tesouro!”,
refletiu Magnus em voz alta.
“De qualquer
forma, temos que aguardar a Matrona chegar para nos levar
até o lugar!”, lembrou Klerf.
“Tem razão!”,
concordou Kariel. “Poderia tentar detectar a jóia,
mas haveria a possibilidade de ser descoberto. Não
sabemos das capacidades do mago da Casa”.
Naquele
momento, uma interrupção: ouviram-se batidas
na porta. Arthos foi atender. Era Triss’nolu.
“E
então!? Está pronto!”, perguntou o
guerreiro.
“Claro! Estou
sempre pronto para estas coisas!”, respondeu Arthos.
“Alguém
mais irá com você?”.
Arthos
olhou para o quarto. Klerf e Limiekki levantaram as mãos.
“Sim.
Nef e Dariel irão conosco!”, disse.
“Ótimo!
Então vamos secar algumas garrafas! Onde está
Marckarius? Ele gosta de um bom vinho!”.
“Ele está
na cidade, mas não sei por onde!”, respondeu
Arthos. “A Aranha Devoradora é a estalagem
onde nos hospedamos assim que chegamos aqui! Pode ser
até que encontremos Marckarius por lá!”.
“Melhor ainda!
Chame seus amigos!”, disse o Mestre das Armas, gesticulando
para Arthos apressar-se.
Os
quatro saíram corredor afora e desceram as escadas
até a área aberta do feudo dos Zaundar,
em direção do portão de saída.
“Soube
que haverá um torneio...”, disse Arthos,
procurando conversar.
“Sim! Acredito
que você se inscreverá. Não perderia
a oportunidade de mostrar sua habilidade na esgrima para
todas as Casas de T’lindeth, não é?”.
“Claro, Triss’nolu!
Pode apostar que sim!”, concordou, sem muita alternativa
o espadachim.
“Meu caro...
eu literalmente irei apostar!”, disse o drow sorrindo
e batendo no ombro de Arthos, amistosamente.
“E você?
Não irá participar?”, perguntou Arthos.
“Não.
Estarei em serviço de minha Casa, de olho no que
acontecerá na arena! Porém irei torcer para
que vença!”.
Antes
de chegarem ao portão de madeira e ferro do feudo,
passou por eles um grupo pequeno de escravos da Casa Zaundar.
Eram cinco humanos, que carregavam cestas pesadas, cheia
de raízes. Uma escrava, uma maltratada, porém
bela, jovem ruiva passou próxima aos quatro andarilhos.
Com seus olhos verdes, ela fitou Klerf e Arthos. Seu olhar
transmitia grande tristeza. Triss’nolu aproximou-se
e, rápido como um relâmpago, desferiu um
potente soco contra a face da jovem, que caiu ao chão
empoeirado, derrubando suas cestas de raízes e
pondo-se a chorar com as mãos no rosto.
“Escrava
insolente!”, bradou o Mestre das Armas, com violência.
“Não sabe que é proibido olhar nos
olhos de seus mestres! Agora vá para o aposento
dos escravos e não saia de lá”.
“Deixe-a! Não
vamos estragar nosso passeio por conta desta escrava!”,
disse Arthos, tentando desviar a atenção.
“A taverna nos espera!”.
“Estes humanos
são um lixo! Deveria matá-la por ter nos
encarado!”, disse o guerreiro drow, contendo sua
fúria, enquanto a jovem corria para longe.
A cena chocou os heróis
e, em especial, Klerf. Seu coração palpitava
acelerado e ele cerrava seu punho com muita força,
contendo o ódio e a vontade de punir aquela covarde
agressão. Por fim, atravessaram os portões,
e estavam novamente na cidade.
Passaram
pela arena, um grande estádio em pedra e mármore
negro.
“É
aqui que serão os jogos?”, perguntou Limiekki.
“Sim. Normalmente
é o local de diversão das classes baixas,
mas amanhã e depois será diferente: as disputas
serão dedicadas a Lolth e somente drows poderão
participar! Você pode aproveitar que estamos aqui
e se inscrever no torneio”, disse o drow.
“Ótimo!
Assim farei!”, respondeu Arthos.
Aproximaram-se
do gradil de entrada da arena e na frente do portão
haviam tendas armadas. Nelas, drows registravam competidores
e distribuíam a programação do evento.
Arthos e Limiekki aproximaram-se.
“Salve,
forasteiros. Desejam se inscrever?”, perguntou o
drow atrás de um balcão.
“Sim. Para o
torneio de esgrima!”, disse Arthos.
“E eu para o
de combate de duas armas!”, completou Limiekki,
que lia um dos programas e que ansiou por um desafio que
o colocasse próximo de matar um daqueles odiosos
drows.
“Pois bem. São
20 peças de ouro!”, falou o balconista.
Arthos
retirou as moedas do bolso e pagou o drow.
“Mas...
qual é o prêmio?”, perguntou Limiekki.
“Os vencedores
ganharão ouro, armas especiais e terão todos
os seus ferimentos curados!”, respondeu o drow.
“Existem algumas regras que devem obedecer: não
podem receber, durante o combate, ajuda externa; nos combates
envolvendo magia, armas não devem ser utilizadas
e, nos combates de armas ou físico, magias não
poderão ser conjuradas. Entenderão?”.
“Parecem razoáveis”,
disse Arthos.
“Desejo-lhes
sorte! Espero que vençam! Afinal ninguém
que quer viver pode perder!”
“Iremos vencer!”,
disse Limiekki, afastando-se.
Reencontraram
Triss’nolu, que os observa ao longe.
“Muito
bem! Torcerei por vocês na arena! Agora vamos beber!”.
Os
quatro atravessaram a imensa praça e chegaram a
Aranha Devoradora. Pediram uma mesa e lá ficaram
conversando e bebendo. Arthos contava aventuras imaginárias,
e era ouvido atentamente por Triss’nolu. Klerf,
pouco tempo depois, alegando não ter se dado bem
com o vinho, levantou-se e foi para o quarto que mantinham
na estalagem. Na verdade, sentia-se ainda revoltado com
o Mestre das Armas e precisava respirar e se refazer.
Um dado momento, o
Mestre das Armas drow chamou o atendente e cochichou algo
em seu ouvido. Minutos depois, duas atraentes meio drows,
vestidas em trajes diminutos, sentaram-se à mesa.
“Essas
são para vocês! É por minha conta!”,
sussurrou ao ouvido de Arthos.
“E você?”,
perguntou Arthos.
“Ainda tenho
que me apresentar em minha Casa! Divirtam-se”, disse
o drow, sorrindo e levantando-se para deixar a estalagem.
“E então,
rapazes?”, perguntou uma das moças. “Vamos
nos divertir mais lá no andar de cima?”.
Arthos
olhou para Limiekki.
“E
agora?”, perguntou ao amigo.
Limiekki
olhou para a Arthos e, em seguida, para as curvas das
mulheres e disse, sorrindo.
“Meu
caro... não podemos comprometer nossos disfarces!”.
E
assim deixaram a mesa, acompanhados.
Escravos
Magnus,
Danicus e Bingo sentavam-se em uma mesa da movimentada
Tarântula. A taverna tinha como consumidores poucos
drows, mas muitos meio-drows e estrangeiros. Os três
tentaram ouvir alguma conversa, mas o assunto dominante
eram os jogos da Arena e, sobretudo, as apostas que se
faziam à cerca dos competidores. Como não
parecia haver nada de útil, puseram-se a aproveitar
o momento e conversar.
“Professor...”,
iniciou Magnus. “O senhor parece mais alegre. Senti
que ficou chateado por não ir conosco em Imaskar
das Profundezas”.
“Sim, meu jovem
Magnus! Gosto de observar as maravilhas das civilizações
e de adquirir novos conhecimentos. Sei que Storm estava
certa, mas não pude deixar de ficar um tanto desagradado!
Sorte que pude ver aquela cidade fantástica enquanto
a nau era reparada”.
“Será
que dessa vez será mais fácil conseguir
a gema?”, perguntou Bingo, pensando na missão.
“Nunca é
fácil, pequeno... mas quem sabe Tymora não
coopere conosco, nos mandando um pouco de sua sorte!”,
disse o professor Harpista.
“Estou preocupado
com nossos amigos na Casa Zaundar. Espero que estejam
bem!”, colocou Magnus.
“E eu também
estou preocupado com Lina e Lino...”, disse Bingo,
pensativo.
“Fique tranqüilo,
Bingo...”, falou o professor, em um sorriso. “Aqueles
dois são meio desordeiros, mas acho que já
estão aqui faz muito tempo e devem saber se virar,
senão já estariam mortos!”.
“E estes escravos,
professor... já viu quantos humanos escravizados
existem aqui? Gostaria de fazer algo para libertá-los!
Imaginem o sofrimento que eles não passam nas mãos
destes drows. ”, disse o paladino, com um tom de
voz bastante sério.
“Humm... tinha
uns escravos à venda no mercado!”, lembrou
Bingo. “A gente poderia comprá-los e levá-los
conosco!”.
“Ou o professor
poderia utilizar uma magia para transportá-los
de volta a Superfície!”, complementou Magnus.
“Sim. Acredito
que posso fazer isto! Posso transportar apenas cinco deles,
mas já são cinco almas que salvaremos”,
concordou Danicus. “Vamos ao mercado, então.
Já é tarde e se demorarmos talvez não
encontremos as lojas abertas!”.
Os
três então pagaram pelas canecas de vinho
tomadas e saíram da Tarântula, rumo a grande
praça do mercado. O local já estava bem
mais vazio e muitas tendas já haviam sido desmontadas.
Porém havia uma, que oferecia escravos, humanos
e bugbears, que estavam acorrentados e em exibição.
Um meio drow com uma enorme cicatriz no rosto conduzia
o negócio.
“Salve!
Queremos comprar escravos humanos!”, falou Danicus
ao homem.
“Custam 20 peças
de ouro por cada um!”, disse o vendedor.
“Queremos cinco,
mas pagaremos somente oitenta peças!”, barganhou
o paladino.
“Faço
por noventa, mas terão que levar uma criança
que tenho aqui!”, contrapropôs o comerciante.
“Feito. Traga-nos
dois homens, duas mulheres e uma criança!”.
O
meio drow desacorrentou os cinco escravos humanos, do
lote de quinze que possuía, e os entregou com as
mãos amarradas aos seus compradores, recebendo
um saco de moedas das mãos de Magnus, cuja verdadeira
vontade era atravessá-lo com Hadryllis e mandar
sua alma perversa para o Abismo.
Os
três aventureiros levaram os cativos até
um beco deserto da cidade. Os humanos não se atreviam
a levantarem suas cabeças e esperavam pelo pior.
A criança, uma menina, chorava baixo.
“Aproximem-se!”,
disse Magnus aos escravos, falando em língua comum.
Em seguida, o paladino, auxiliado por Bingo, cortaram
as cordas que amarravam os pulsos dos cativos. “Tome!”,
continuou o paladino, entregando a uma das mulheres um
pequeno saco. “São 30 peças de ouro!
Vocês serão transportados até a Superfície.
Use este dinheiro para levar vocês aos locais de
onde pertencem. Vocês estarão livres”.
“M-mas... porque
estão...”, ia perguntar a mulher, quando
foi interrompida.
“Por favor,
minha jovem, não faça perguntas! O que importa
é que estão livres! Irão surgir em
Berdusk! Boa sorte em sua viagem para a casa!”,
disse Danicus, que logo após realizou gestos e
proferiu palavras arcanas, fazendo os cinco desparecerem,
rumo a superfície.
“Vamos ver conseguimos
fazer isto novamente amanhã!”, disse Magnus.
“Devemos retornar
a estalagem. Está tarde e temos que trocar idéias
com os nossos colegas e descansar!”, orientou o
professor. Bingo e Magnus concordaram.
Ao
chegar no quarto da Aranha Devoradora, encontraram Klerf.
O jovem Harpista trocou informações sobre
o que havia acontecido na Casa Zaundar e o incidente com
a escrava, horas atrás. Magnus o aconselhou a suportar
o fardo em benefício da missão e das muitas
outras pessoas que poderia ter suas vidas comprometidas
caso falhassem. Klerf aceitou as palavras do paladino,
ainda que seu coração pesasse como chumbo,
por nada poder fazer.
A Agente
Arthos
havia consumado seu momento de prazer com a belíssima
meio drow e dormia em um dos quartos do primeiro andar
da Aranha Devoradora, quando sentiu a fria e pontiaguda
extremidade de uma espada pressionar seu ventre. Acordou
o espadachim, desprovido de arma e de roupas, vendo a
sua frente uma drow. A mesma dona da estalagem. Sua companheira
de leito também acordou, assustada.
“Saia
agora!”, comandou a drow, sendo obedecida imediatamente.
“O que é
isso! É a dona da taverna, não? O que há?”,
perguntou Arthos.
“Você
não é um drow. Quem você é
e o que quer?”, perguntou a elfa das sombras.
“Ora... sou
Torrelan Millithor! E que insulto é esse que...”.
“Basta!”,
disse forçando o aço contra a barriga nua
do desprevenido herói. “Vi o que fez com
ela... um drow seria bem mais selvagem! Observei também
você e seus amigos comentarem sobre o colar com
o símbolo do Fogo Lunar. Na próxima vez,
lembrem-se de não procurar somente por observações
mágicas.”
“O que sabe
sobre o Fogo Lunar?”, perguntou Arthos.
“O suficiente
para dizer que se alguém lhes deu o símbolo,
não tem o que temer! Mas preciso saber quem lhe
entregou e o porquê”.
“Meu nome é
Arthos. Tivemos contato com o Fogo Lunar em Undrek’Thoz.
Eles nos ajudaram em nossa missão e uma agente
chamada Chessintra nos deu o colar, para que, se encontrássemos
um agente, pudéssemos ser reconhecidos”.
“Chess... pois
bem!”, disse a drow, baixando a arma e entregando
os trajes de Arthos. “Meu nome é Sérnia
e sou uma agente do Fogo Lunar!”, revelou, ao mostrar
o colar prateado que escondia sobre suas vestes. “Se
Chessintra e meus companheiros os auxiliaram, devo fazer
o mesmo. Diga o que precisam!”.
“Precisamos
encontrar uma jóia mágica e um arco feito
em pedra, que estão escondidos na sala do tesouro
da Casa Zaundar ! Estamos infiltrados por lá. Se
você e seus companheiros puderem nos ajudar com
algo, ficaremos gratos!”, disse o espadachim, recompondo-se.
“As salas do
tesouro são locais restritos e com muitas proteções.
Infelizmente não tenho informações
sobre o que buscam, mas tentarei encontrar uma maneira
de ajudá-los. E enquanto aos meus companheiros...
sou a única representante do Fogo Lunar por aqui.
Todos os outros foram convocados para ir a Menzoberranzan.
Existe algo que está exigindo nossa atenção,
mas não sei do que se trata”.
“Será
por conta do silêncio de Lolth?”, perguntou
Arthos.
“Silêncio?”,
estranhou a drow. “Não sei do que está
falando!”.
“Então
prepare-se: Lolth parou de atender as preces das sacerdotisas.
Elas estão sem poderes. Inclusive uma cidade, Maerimydra,
foi destruída por conta de um levante de escravos.”
“Pela Dama Dançarina!
Isso é impressionante! Além dos escravos,
servos de deuses rivais de Lolth podem ser levantar contra
as sacerdotisas. É possível também
que drows que discordam de sua filosofia, mas que temem
os castigos da deusa venham para a causa de Eilistraee.
É uma boa notícia!”.
“Sim! As matronas
estão fazendo grande segredo sobre isto!”.
“Agradeço
a informação e farei o que puder por vocês,
mas talvez seja eu também a pedir-lhes ajuda!”.
“O que há?”,
quis saber Arthos.
“Estou planejando
uma fuga de escravos humanos da Casa Zaundar, amanhã,
durante a final do torneio de esgrima, quando a vigilância
e o movimento das ruas estarão menores. Eu e um
homem chamado Cintal de Halruaa iremos invadir um porto
de embarcações aéreas e roubar uma
delas. Preciso de pessoas para confrontar os guardas.
Retiraremos o barco e embarcaremos os escravos. Iria tentar
o contato de mercenários para abrir a fechadura
do local onde os escravos se encontram na Casa Zaundar,
mas se puderem fazê-lo, o risco de uma traição
cairá bastante.”.
“Estarei ocupado
neste momento, mas meus amigos poderão colaborar!
Vou conversar com eles”.
“Ótimo!
Entrarei em contato com vocês novamente na arena.
Eu os encontrarei e de lá partiremos para a missão!”.
“Está
bem! Ficaremos aguardando”.
Após
isto, Sérnia deixa o quarto. Pouco depois, Arthos
chama seu companheiro Limiekki, que estava em um quarto
próximo e sobem um andar, para o quarto coletivo,
onde se encontravam Magnus, Danicus e Bingo. Reunidos,
o espadachim relatou o acontecido, omitindo apenas alguns
detalhes mais constrangedores sobre a descoberta de seu
disfarce. Os presentes decidiram por auxiliar Sérnia,
especialmente Klerf, que ofereceu-se para fazer parte
do grupo que roubaria a embarcação. Durante
a conversa, surgiu à sugestão de revelar,
durante os jogos, através de uma magia de ilusão,
o grande segredo sobre Lolth. Não houve uma decisão
a respeito disto, mas seria algo a ser melhor estudado.
Em seguida, Arthos, Limiekki e Klerf retornaram para a
Casa Zaundar, onde contaram todas as recentes notícias
a Mikhail e Kariel. Por fim, foram todos deitar, para
estarem prontos para o novo dia.
A Ação
Clandestina de Klerf
Klerf
não conseguia dormir. Sua mente e coração
estavam intranqüilos e, então, tomou uma decisão.
Esperou seus companheiros dormirem. Até mesmo Kariel,
que geralmente apenas dormia duas horas por noite, estava
sonhando. O Harpista foi, então, pé ante
pé, até a porta e usou sua habilidade para
abri-la e fechá-la com o mínimo ruído.
Passou pelos corredores e desceu as escadas. Havia guardas
na entrada da torre, mas como estavam informados da presença
e da condição de convidados dos Millithor,
não perguntaram nada.
O
jovem humano em disfarce de drow então atravessou
o feudo, rumando para um edifício quadrangular
e baixo, bastante rústico. Era para onde a escrava
ruiva havia se dirigido, após a agressão
perpetrada pelo Mestre das Armas da Casa Zaundar. Uma
grande grade selava a entrada e quatro sentinelas guardavam
o local. Um deles aproximou-se de Klerf.
“Senhor!
O que deseja? Aqui é o alojamento dos escravos!”.
“Eu sei disto!
Minha senhora deseja uma escrava para auxiliá-la
no banho”, disse.
“Está
bem! Pode escolher e levar a que for de seu agrado!”,
concordou o soldado, abrindo um grosso cadeado e deslizando
a grade.
Klerf
buscou em meio aos humanos maltratados que dormiam no
chão de pedra e areia, a ruiva de horas atrás.
Estava ela deitada em um canto. Parecia muito mal e era
cuidada por um ancião. Disse então Klerf,
em língua comum.
“Venha
comigo!”.
“Ela está
muito mal, senhor! Não a leve!”, pediu o
ancião.
“Cale-se!”,
disse ríspido, em fingimento. Klerf ajudou a mulher
a levantar-se. Suas mãos estavam frias e ela suava.
Nada falou a escrava.
Klerf
deixou o alojamento, que foi novamente trancado, e retornou
a torre onde os Millithor estavam hospedados. Bateu na
porta do clérigo de Mystra, Mikhail.
“Quem
está aí?”, perguntou o elfo.
“Nef, minha
senhora!”, respondeu, disfarçando. “Trouxe
a escrava!”.
Mikhail
abriu a porta, confuso e um tanto contrariado.
“O
que é isto, Klerf!? Enlouqueceu? Porque trouxe
essa escrava aqui?”.
“Ela não
sobreviveria se eu não a trouxesse! Veja o estado
dela. Seus ossos devem ter se partido com o soco que recebeu.
Ela está com febre e dor. Por favor, a cure!”.
“Falou com os
outros sobre sua atitude?”, perguntou Mikhail.
“Não!
Não me deixariam vir!”, respondeu Klerf.
“Sei que não agi como deveria e que mereço
alguma punição, mas não a deixaria
morrer! Sinto muito!”.
“Chame Kariel
e retorne!”, ordenou o elfo e Klerf atendeu.
Minutos
depois, entram os dois de volta ao quarto.
“Klerf
me contou a situação! Não posso culpá-lo
pelo que fez, mas atitudes impensadas podem nos trazer
problemas. Mas já que isto já está
feito, Mikhail, cure a jovem!”.
“Mas os guardas
poderão estranhar a aparência dela, já
que desaparecerão os hematomas e o inchaço!”.
“Vamos disfarçar
isto! Pode curá-la!”, disse o mago elfo.
Mikhail
então pronunciou um pedido a deusa Mystra e executou
gestos sagrados. Toda a dor e ferimentos da jovem desapareceram.
“Porque
fizeram isto?”, perguntou a jovem, em língua
comum.
“Qual é
o seu nome?”, inquiriu Kariel, sem responder.
“Meu nome é
Kayla!”.
“De onde você
vem, Kayla?”, interferiu Klerf.
“De Halruaa.
Fui capturada na fronteira de Dambrath! O que querem comigo?
Vocês são drows... o que eu importo para
vocês?”, disse a jovem, confusa.
“Nem tudo é
o que lhe parece aos olhos!”, respondeu Mikhail.
“Não
lhe queremos mal. Podemos transportá-la para a
superfície e lhe daremos dinheiro para que consiga
retornar para sua casa!”, disse o mago da Comitiva.
“A troco de
quê?”, perguntou a moça ruiva.
“De nada! Ninguém
merece ser maltratado como você e seus companheiros”,
falou Klerf, olhando para o belo rosto da jovem.
“Vocês
são diferentes! Algo me diz que posso confiar em
vocês! Não posso ir e deixá-los. Alguém
de fora disse que seríamos libertados amanhã!
Alguém abrirá as trancas quando a guarda
for relaxada. Serão vocês?”.
“Provavelmente!”,
respondeu Kariel. “Quantos são de vocês?”.
“Somos poucos
humanos. Somos dezoito ao todo. A maioria dos escravos
desta Casa são orcs e bugbears.”.
“Fiquem alerta!
Será próximo ao fim da tarde! Agora devemos
reconduzir você”, disse Klerf. “Mas
antes, um pequeno disfarce!”.
Klerf
tomou um pouco de carvão, que restava na lareira,
e misturado com um bálsamo que Kariel possuía,
improvisou uma maquiagem e aplicou sob o olho direito
de Kayla.
“Obrigado!
Que Tymora ilumine os seus caminhos!”, desejou a
ruiva. “E obrigada por ter ido até mim!”,
disse a Klerf. “Salvou-me a vida!”.
“Que Mystra
a guarde!”, respondeu Mikhail, pouco antes de Klerf
fechar a porta.
O
Harpista conduziu a jovem pelos corredores, e a retornou
ao alojamento dos escravos, sem que nenhuma pergunta fosse
feita ou atitude suspeita fosse tomada. Voltou ao quarto
e, enfim, dormiu, junto com seus companheiros.
O Início
dos Jogos de Lolth
O
relógio de sol drow era uma imensa e delgada torre
negra no centro da cidade, alta o suficiente para ser
vista de qualquer ponto de T’lindeth. Nela, um sulco
formava uma escala dividida em três partes principais,
equivalentes aos três grupos de oito horas de um
dia e, dentro delas, subdivisões de oito linhas.
A cada hora, uma linha no sulco se acendia. Agora haviam
sete delas acesas.
Soldados
bateram a porta dos dois quartos que os Millithor ocupavam
na Casa Zaundar. Informaram aos convidados que a comitiva
da Casa iria se dirigir para a abertura dos jogos, na
arena e chamaram os Millithor para acompanhá-los,
no que os heróis disfarçados concordaram.
Mikhail reuniu-se brevemente com os seus companheiros,
no quarto coletivo, a fim de que Danicus renovasse as
magias que faziam parecerem drows. Feito isto, Mikhail,
Arthos, Klerf e Limiekki deixaram o aposento, ficando
Danicus e Kariel na Casa drow.
Os
quatro da Comitiva encontraram-se com os drows no pátio.
Havia duas liteiras, uma dedicada à sacerdotisa
Telabrina, e outra à Narcélia Millithor.
Ambas seriam carregadas por robustos escravos bugbears.
Os demais seguiriam a pé as poucas centenas de
metros que separavam o feudo da Arena.
Quando
deixaram os portões, já se podia notar a
agitação incomum: muitos mais drows havia
nas ruas e todos rumavam para o grande estádio
de pedra negra. Os Zaundar deixaram seus escravos ao chegar
em um portão exclusivo para os nobres e subiram
corredores e escadas, rumo as cadeiras especiais que ocupariam
em torno da arena. Era das sacerdotisas os lugares especiais,
no centro das arquibancadas. Telabrina levou Mikhail,
ou melhor, Narcélia Millithor, para um destes assentos.
Os demais ocuparam locais menos nobres e confortáveis.
De lá, assistiram a uma hora de desfiles militares
com os membros das Casas de T’lindeth. Então
soaram trombetas. A arena esvaziou-se e uma figura surgiu
em um púlpito, ao lado de um altar de mármore
branco. À aparição, seguiu-se o silêncio
de todos. Era a sacerdotisa máxima de Lolth em
T’lindeth e líder da Casa Barriervs, Akoryna
Barriervs. Ela começou a falar e sua voz era amplificada
através de uma prática magia, conjurada
sobre o púlpito negro, adornado com o símbolo
sagrado da Deusa Aranha.
“Ajoelhem-se
e repitam!”, comandou a drow, sendo prontamente
atendida por todos os presentes. “Tudo devemos à
Lolth. Ela é a protetora e guardiã e dela
queremos seu favor! Que o sacrifício e os jogos
de hoje honrem o seu nome!”.
Ao
final da frase, dois guerreiros drows surgem de dentro
da tribuna de honra, trazendo consigo o corpo nu e amarrado
de um elfo dourado, que se debatia inutilmente, enquanto
era posto no altar. Arkoryna colocou-se em frente à
ele com um punhal feito de um cristal negro e bradou:
“Morra
em nome de Lolth!”
“Corellon é
maior!”, gritou o elfo, pouco antes do punhal descer
em seu coração e arrancar-lhe a vida, para
delírio da multidão e a dor e sofrimento
dos heróis da Comitiva, em especial de Mikhail,
ele próprio um elfo dourado. Sentiu impotência,
tristeza e ódio e esforçou-se para conter
lágrimas persistentes.
“Que
os jogos comecem!”, proclamou a Matrona. Era o início
das disputas e de um dia de perigo para aqueles conhecidos
como a Comitiva da Fé.
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