Undrek'Thoz
Descrita
por Ricardo Costa.
Baseada no jogo mestrado por Ivan Lira.
Personagens
principais da aventura:
Os
Humanos: Arthos Fogo Negro [Sohtrax
Chumavh]; Magnus de Helm [Zoun Katar Chumavh];
Sigel O'Blound (Limiekki) [Dron'Karnot
Chumavh]; Danicus Gaundeford [Glemoran
Chumavh] e Klerf Maunader. Os Elfos: Mikhail
Velian [Exxor Chumavh]; Kariel Elkandor
[Vandrax Chumavh]. O Grimlock: Loft
Moft Toft Iskapoft. O
Halfling: Bingo
Playamundo [Taz'Uthur Chumavh]. Participação
Especial: Storm Mão Argêntea.
Undrek'Thoz
Uma
Abordagem Equivocada
Agricultores
colhem trigo em um dia quente e cotidiano no interior
do país de Thay, sem saber que, milhares de metros abaixo
de seus pés, corre um trecho de cavernas de um mundo
próprio, um reino de trevas eternas, chamado de Subterrâneo.
Neste lugar, através de um gigantesco túnel cavernoso,
flutua no ar a nau mágica do grupo de aventureiros conhecidos
como a Comitiva da Fé. O cruzador mágico deixou, a cerca
de um dia, o ponto onde os heróis conseguiram a ajuda
das criaturas conhecidas como ‘come-pedras’ e
onde também embarcou um novo integrante daquela expedição,
um grimlock chamado Iskapoft.
Arnilan Beldusyr, o piloto evereskano, parou
a embarcação. O farol da proa revelou que estavam à frente de uma bifurcação
que conduzia a dois túneis. Junto com o elfo, na cabine de comando, estavam os
aventureiros.
“Segundo o mapa, a cidade de Undrek’Thoz
está á frente!”, informou o professor Danicus, que estava na cadeira ao
lado da de Arnilan, voltando-se o grupo que sentava atrás. “Mas não há a
indicação clara de qual túnel devemos seguir!”.
“Acredito que devemos preparar um grupo
de exploração. Descer e tentar encontrar algum indício da cidade. Se for uma
metrópole, como as informações dizem, devemos avistar algum tipo de construção
visível!”, sugeriu Storm Mão Argêntea, a inteligente mulher de cabelos
prateados e líder daquela missão.
“Não podíamos avançar mais com a nau
em um destes corredores?”, perguntou Bingo, o halfling.
“Seria perigoso. Se estivermos próximos
demais, chamaremos muita atenção, o que pode comprometer nossos objetivos!”,
respondeu a Barda.
“Vamos então formar o grupo e descer!”,
disse Magnus, o paladino do Deus Guardião Helm. “Sinceramente, depois de
tanto tempo neste barco, prefiro me mexer um pouco!”
“Um momento, meu jovem!”, disse
Danicus. “Existe mais a saber da cidade, antes de nos aventurarmos à sua
procura. O professor Danicus então começou uma preleção, informando-os sobre
o que havia nos diários de Ki'Willys, a matrona dos Millithor, sobre Undrek'Thoz.
Segundo os escritos, Undrek'Thoz era uma
grande metrópole, divida em distritos separados, cada um deles pertencentes à uma
Casa Drow. Danicus citou um a um seus estranhos nomes e as matronas que os comandavam:
Phaundakulsan, matrona Ithrylda da Casa Phaundal; Brundag, matrona Jazmyndeera
da Casa Brundag; Fyvrek'Zek, matrona Varr'Ga zek da Casa Fyvrek’Zek, Nanitaran,
matrona Uphrezza da Casa Nanitarin; Sshurlynder, matrona Oryssta da Casa Sshurlynder;
Vrasl, matrona Harthel da Casa Vrasl; Mezrylornyl, matrona Quemm Merzryl da Casa
Mezrylornyl; Trun'Zoyl'Zl, matrona Jesthflett da Casa Trun'Zoyl'Zl; e Jenn'Yxir,
matrona Loxxa da Casa Jenn’Yxir. Havia uma casa extinta, chamada Drezz'Lynur.
Seu terreno havia sido tomado por uma revolução de escravos. A Casa Trun'Zoyl'Zil
era o clã drow que havia recebido a jóia mística das mãos dos Millithor e que
fazia parte do plano para invadir os territórios da superfície.
“Sugiro que vão Magnus, Bingo, Kariel,
Limiekki, Mikhail e o prof. Danicus nesta missão. Iskapoft pode ir também, visto
que parece conhecer algo da cidade. Convém que adotem novos nomes e aparências,
caso Torrellan Millithor tenha conseguido chegar até aqui.”, sugeriu Storm.
“Já selecionei alguns nomes drows para
esta eventualidade, senhora Storm!”, respondeu o precavido Danicus, abrindo
uma pequena caderneta que possuía.
Os heróis olharam os nomes e debateram a
melhor forma de se inserirem. Seriam drows refugiados da extinta Casa Chumavh,
da cidade de Maerymidra, cujas matronas e sacerdotisas teriam sido mortas. Adotariam
os nomes de Southrax e Vandrax, para Arthos e Kariel; Dron'Karnot e Glemoran
para Limiekki e o professor Danicus; Zoun Katar e Taz'Uthur para Magnus e Bingo
e Exxor, para Mikhail. Adotariam uma aparência de drows comuns, com roupas surradas.
Felizmente para todos, especialmente para Mikhail, que vez ou outra ouvia piadinhas
do gozador Arthos, seriam todos drows masculinos. Iskapoft também iria com eles,
na condição de escravo.
Definida a estratégia, a Comitiva desceu
da nau, sob o encanto que lhes alterava a aparência. Iskapoft, que também estava
com eles, no entanto, exibia sua própria forma medonha.
O túnel era enorme e as trevas completas
eram apenas afastadas pela luz das lanternas empunhadas por Limiekki e Magnus,
e pela iluminação azulada que emanava da lâmina élfica encantada de Kariel. O
caminho era difícil, cheios de enormes pedregulhos soltos e empilhados, os quais, às
vezes, tinham que escalar. Encontraram, porém, após cerca de quarenta minutos
de caminhada, uma trilha mais limpa, com uma quantidade menor de pedras e um
piso arenoso. O mateiro Limiekki agachou-se e examinou o solo.
“Existe alguma atividade nesta trilha!”,
anunciou. “Não consigo determinar o tempo exato, mas alguns humanóides
estiveram por aqui recentemente! É melhor tomarmos cuidado!”
A advertência do homem de Forte Zenthil levou
ainda mais cautela aos membros da Comitiva, que passaram a andar ainda mais silenciosamente,
tentando apurar ao máximo a audição (o sentido talvez mais valioso em uma caverna)
e esmiuçar cada detalhe revelado pela parca iluminação que dispunham. Minutos
depois, ouviu-se algo: um ruído de passos vindo de um trecho à frente, ainda
encoberto pelo relevo de pedras.
“Shh! Escondam-se fora da trilha!”,
advertiu novamente Limiekki.
Os heróis apagaram suas fontes de luz e ocultaram-se
atrás das rochas. Em silêncio, viram uma iluminação fraca ir aos poucos se aproximando,
e com ela três silhuetas de criaturas bípedes. À medida que se aproximavam, os
heróis puderam descobrir de que se tratavam de três grandes humanóides peludos
com aparência de feras. Estavam armados com maças e seguiam o caminho no sentido
contrário ao feito pela Comitiva. Os três passaram pelos heróis sem os notarem
e aos poucos, a luz fraca foi ficando cada vez menor, até desaparecer da visão
dos aventureiros, que acenderam novamente suas luzes e voltaram para a trilha.
“Um patrulha de bugbears!”, exclamou
Mikhail.
“É melhor apagar uma das lanternas,
para reduzir a luminosidade!”, sugeriu Arthos.
Assim continuaram, com mais dificuldade. Galgaram uma grande
pilha de pedregulhos. Após ela, agachados, contemplaram uma
inesperada visão panorâmica: uma vila desorganizada de cabanas
de pedra rústicas, iluminadas por tochas esparsas. Havia muitos
orcs, mas também bugbears e goblins. Bem ao longe, atrás da
vila e de mais dezenas de metros de cavernas, puderam ver uma
espécie de construção, um tipo de torre, com pequenas janelas
iluminadas.
“A cidade drow deve ficar após esta
vila. Aquela construção deve ser parte dela!”, observou o professor Danicus.
“Então teremos que passar por estes
goblinóides para chegar até ela?’, Falou Bingo. apontando para os habitantes
da vila. “Mas... como faremos isto?”
“Kariel pode lançar um encanto e nos
disfarçar!”, sugeriu Arthos.
“Na verdade posso, Arthos, mas perderíamos
a possibilidade de ficarmos novamente como drows, se por acaso nos demorarmos
em terras inimigas! Talvez fosse bom guardar este encanto como último recurso!”
“Bem... e como vamos fazer?”,
quis saber Magnus paladino.
“Passamos pela orla da vila, no escuro.
Com um pouco de sorte, atravessamos sem que ninguém nos veja!”, formulou
Mikhail um precário plano, que naquele momento parecia fazer muito sentido.
“Está certo, mas se formos descobertos?
Como nos saímos!?”, Limiekki perguntou.
“Bem...só nos resta agir como drows!”,
disse Arthos.
Os heróis então começaram a por em prática
a estratégia para seguir o caminho até a cidade drow: apagaram a lanterna que
ainda brilhava e Kariel desativou a emanação azulada de sua espada mágica. Foram
descendo, usando apenas o que a visão dos olhos de drow, muito melhores do que
os dos homens ou elfos para a escuridão, podia perceber das pedras. A vila dos
homens feras e goblinóides ficava em um platô plano e limpo, rodeado por rochas,
poeira e areia. Foi por esta parte acidentada que a Comitiva resolveu atravessar.
Não havia ninguém por perto e tudo corria
bem. Parecia que os habitantes daquela aldeia estavam mais preocupados com seus
afazeres do que com possíveis invasores e os heróis avançaram com certa facilidade.
Estavam no meio do caminho, ansiosos para atravessar finalmente aquela área,
quando foram vistos por um pequeno goblinóide. Parecia ser uma criança orc. Ela
brincava próximo dos entulhos e de repente parou bem em frente da Comitiva. Olhava
Arthos fixamente.
“Shhh!”, sussurrou o espadachim,
colocando o dedo indicador nos lábios, pedindo silêncio.
Ao contrário do que esperava, o pequeno
correu em direção da aldeia gritando desesperadamente e apontando na direção
dos furtivos invasores. Os heróis ensaiaram uma corrida, mas logo haviam goblinóides
e bugbears armados vindos de todos os lados. Um deles, um guerreiro bugbear que
usava uma maça, gritou, em língua drow.
“O que querem aqui?!”.
“Só queremos passar! Deixe-nos e não
atacaremos vocês!”, disse Kariel, em um tom de voz um tanto arrogante,
tal qual um drow poderia pronunciar.
“Estão aqui para nos atacar ou espionar!”,
bradou um outro aldeão, escondido na pequena aglomeração que começava a se formar.
”Não damos satisfações a escravos!”,
gritou Arthos.
A declaração enfureceu um grande orc que partiu
com um martelo para golpear Arthos.
“Não somos mais escravos”, gritou
o monstro.
O ódio não é bom amigo dos combatentes.
Arthos facilmente se esquivou e com muita agilidade sacou o sabre para matar
o agressor. Imediatamente a multidão começou a cercar os heróis, gritando e empunhando
armas.
“Isso não bom!”, murmurou Iskapoft.
“Arthos!”, censurou Mikhail.
“Eu só estava agindo como um drow!”,
respondeu o espadachim
“Fiquem de costas um para o outro. É a
melhor forma de nos defendermos dessa multidão!”, sugeriu Magnus.
“Não vamos durar muito. Devem ter uns
duzentos destes orcs e bubears aqui! Kariel... não pode fazer alguma coisa?”,
pediu Limiekki.
O arcano já se preparava para uma conjuração.
Concentrou-se e pronunciou palavras arcanas. Em um átimo, paredes flamejantes
cresceram do chão e circundaram a Comitiva, afastando-os dos seus inimigos.
“Não podemos ficar aqui indefinidamente.
Vou nos teleportar para as proximidades do início do túnel!”, disse o elfo
arcano. Ele invocou outro feitiço e os heróis desapareceram. Surgiram dezenas
de metros atrás. Fizeram o caminho de volta e felizmente não encontraram a patrulha
que haviam visto passar. Ao chegar na entrada do trecho da caverna, Kariel comunicou
a Storm a presença do grupo, através de sua ligação telepática, e a nau desceu
do alto de seu esconderijo nas sombras.
“O que houve?”, perguntou a Barda. “Descobriram
alguma coisa?”.
“Vimos uma torre ao longe, depois de
uma grande aldeia de bugbears, orcs e outros goblinóides. Mas não conseguimos
chegar lá. Fomos atacados por eles e tivemos sorte em fugir!”, contou Arthos,
com poucos detalhes.
“Talvez fosse o distrito de Drezz'Lynur!”,
conjecturou o professor Danicus.
“Ainda há o outro caminho! Pedirei
a Arnilan para rumar para o outro túnel!”, disse Storm.“Talvez lá tenhamos
mais sorte!”
Os Portões
de Nanitarin
Durante
os minutos em que singravam o ar da caverna no novo túnel,
alguns foram para a cabine, outros preferiram ficar na
proa, olhando para o que o farol iluminava. Meia hora
depois, o grupo de exploradores novamente pisou o solo.
Decidiram descer. Acreditavam que, pela direção e distância,
poderiam estar próximos à torre que haviam avistado.
O barco voador não podia levá-los muito perto, sob pena
de ser denunciado pelo seu farol ou por uma iluminação
qualquer da cidade.
Esboçaram um plano: parte do grupo tentaria
se infiltrar na Casa Trun'Zoyl'Zl. Os demais tentariam descobrir de outros lugares
da cidade drow, possibilidades que pudessem contribuir para o sucesso da missão.
Kariel e Arthos decidiram pela primeira opção, enquanto os demais, pela segunda.
Encontrariam-se regularmente, para trocar informações e renovar o encanto de
disfarce que os permitiam parecer e falar como drows.
O mesmo grupo desceu e percorreu uma trilha,
que margeava a gigantesca parede rochosa do túnel. Vinte minutos depois, após
virarem um paredão, conseguiram avistar algo: uma grande muralha e um portão
de aço negro, iluminado por um brilho esverdeado que partia de estranhos cristais
postos em um suporte em cada lateral da passagem. Por detrás daqueles altos muros,
emanava luz e podiam-se ver algumas sombras de construções. Havia muitas silhuetas
na entrada, mas duas delas demonstravam ser sentinelas drows armados, que guardavam
a entrada.
“Enfim. Esta deve ser a entrada para
Undrek'Thoz!”, exclamou Danicus.
“Lembrem-se: tenhamos muito cuidado
na hora de agir. Não tomemos decisões precipitadas!”, aconselhou o clérigo,
relembrando o fracasso anterior.
“Vamos andar em direção do portão,
devagar e sem promover nenhuma ameaça!”, colocou prudentemente o jovem
paladino Magnus.
E assim foi aquela Comitiva. À medida que se aproximaram,
viram mais drows e foram vistos também. Eram cerca de vinte soldados, em bruneas
de aço escuro e armados com sabres e bestas, que estavam apontadas para o grupo.
Os aventureiros caminharam, então, com as mãos erguidas para o alto, e enquanto
se aproximavam do portão, puderam ver além da muralha, alguns prédios que despontavam
em direção ao alto.
“Alto! Identifiquem-se!”, bradou
um oficial esbelto e de cabelos longos e brancos, que se projetou do grupo.
“Somos refugiados! Viemos de outra
cidade e procuramos abrigo!”, respondeu Kariel ao drow.
“De outra cidade? De que lugar estão
falando?”, continuou o oficial.
“Maerymidra!”, respondeu Mikhail.
“Maerymidra?”, estranhou o militar
drow, procurando em suas memórias o nome pronunciado pelo forasteiro. “Sim.
Lembro-me... não sabia que tal cidade ainda existia.”.
“Existia até pouco tempo, mas agora
dela só restam ruínas!”, respondeu Arthos.
“Por quanto tempo viajaram?”,
continuou.
“Por muitos dias! Não sabemos precisar.
Foi uma viagem longa e difícil. Perdemos muitos companheiros!”, disse Mikhail.
“Está bem! Deponham suas armas. Iremos
levá-los até o nosso superior!”, disse o militar, finalizando aquele interrogatório
preliminar.
Três drows se aproximaram e os heróis deram-lhes
suas armas. Nesse momento, os soldados aproximaram-se de Iskapoft e, assustando-se
com o horrendo companheiro da Comitiva, sacaram as armas e se mantiveram na defensiva.
“E quem é este?”, perguntou mais
uma vez o drow comandante da sentinela.
“É nosso escravo. O único que restou-nos!”,
explicou Kariel.
“Se ele é um escravo, porque carregam
vocês mesmos suas mochilas e pertences?”
A pergunta foi um tanto inesperada, mas Arthos
respondeu, antes que o silêncio começasse a despertar dúvidas.
“Não deixaremos nossos únicos pertences
nas mãos de um escravo. Eles não são confiáveis!”
“Vocês podem ter razão, mas por mim
deixava este infeliz carregar todo o peso!”, disse o oficial, satisfeito
com a resposta. “Sigam-me!”
O drow, seguido de mais quatro outros militares
de patente inferior, que levavam os pertences dos forasteiros, rumaram para frente
do imenso portão, que foi aberto. Revelou-se uma grande e iluminada cidade. Não
era escura e rústica como a anterior Maerymidra. As construções eram muito mais
belas e trabalhadas, lembrando até mesmo os detalhes da arquitetura élfica, porém
sem a mesma leveza e suavidade. Em muitos postes, haviam sido pendurados vidros
e, dentro deles, cresciam cogumelos verdes fosforescentes, com uma luminosidade
tão intensa que incomodava um pouco os sensíveis olhos de drow. Enquanto caminhavam,
passaram por uma larga praça onde podiam ver estabelecimentos diversos. Uma torre
estreita e esguia, tal qual um monólito negro, erguia-se acima de todas as construções.
Nela existia uma fenda estreita e vertical e uma chama prateada tremeluzia em
um trecho dela, como se fosse um sinal. Bingo apontou algo que parecia ser uma
galeria de arte. Jamais esperavam tal sofisticação, tratando-se de drows. Aranhas
gigantes e lagartos monitores eram utilizados como montaria. Viram também uma
movimentada taverna.
“Acho que vou gostar deste lugar!”,
cochichou Arthos para Limiekki.
Seguiram por uma rua larga na direção de
uma pequena torre circular, baixa, mas bastante ampla. Caminharam por um corredor
e entraram em uma sala. O oficial que os conduzia pediu-lhes para aguardar. Cinco
minutos se passaram até que entrou no cômodo quadrado um drow alto e musculoso,
vestindo uma armadura de cota de malha negra e uma capa vermelha. Em um relevo
de prata, havia um símbolo de uma aranha negra, sobre um hexágono, padrão
este visto pela Comitiva em alguns prédios da cidade. Olhou por um instante
para os maltrapilhos recém chegados e disse.
“Soube que vocês vieram de Maerymidra.
O que aconteceu com a cidade?”, perguntou o comandante.
“Maerymidra foi destruída por uma revolta
de escravos. Não restou nada!”, informou Kariel.
“Os seguidores de Lolth foram massacrados.
Nós somos alguns dos poucos sobreviventes. Nossa Casa foi destruída, nossas
sacerdotisas e matrona, assassinadas”, completou Arthos.
“Deve ter sido uma viagem muito difícil
até chegarem aqui!”. disse o drow.
“Sim. Perdemos muitos companheiros
e agora precisamos de abrigo”, falou Mikhail. “Então
são drows sem Casa. É prudente dizer que pretendem ingressar em alguma Casa de
Undrek'Thoz?”, sugeriu o militar, com algum interesse.
“Sim! Aqueles que não tem uma Casa
são somente párias!”, respondeu Kariel com firmeza.
“Quem sabe vocês podem ser boas aquisições
para nossa sociedade. Perdoem-me a minha indelicadeza. Chamo-me Rizzen Nanitarin,
Mestre das Armas da Casa Nanitarin! E vocês, quem são?”
“Sou Sohtrax Chumavh e estes são Vandrax,
meu irmão, Dron'Karnot, Zoun Katar, Taz'Uthur, Exxor e Glemoran!”, apresentou-se
Arthos, referindo-se à Kariel, Limiekki, Magnus, Bingo, Mikhail e o prof. Danicus. “Ah!
E esta criatura infeliz é o nosso escravo Iskapoft!”, complementou.
“Em nossa cidade, uma das causas do
conflito foi o silêncio da Deusa Lolth em relação às nossas preces! Isto por
acaso aconteceu aqui também?”, perguntou Mikhail.
“Infelizmente sim, mas conseguimos
controlar a situação, apesar da aura de tristeza que se abateu sobre nós. Porém,
a ausência do poder de Lolth nos enfraqueceu perante nossos inimigos, os escravos
de Drezz'Lynur!”
“Drezz'Lynur? Onde fica isto?”,
perguntou Limiekki, querendo mais detalhes.
“Drezz'Linur foi uma Casa drow que
foi dominada e extinta, graças aos escravos e alguns monstros da superfície!”,
explicou Rizzen.
“Superfície?!”, fez-se Kariel
de ignorante. “O que é isto!?”
“É um local que está acima de nossa
cidade, acima das rochas, onde vivem várias criaturas diferentes e estranhas.
Algumas delas, chamadas de orogs e globlinóides, desceram até Drezz'Lynur e formaram
uma comunidade.”
“Encontramos uma comunidade hostil
antes de entrarmos no túnel que nos levou a Undrek'Thoz. Os monstros tentaram
nos atacar, mas conseguimos fugir!”, disse Kariel. “Acredito
que pode ser uma das aldeias que existem em Drezz'Lynur! Mas, vocês são somente
oito! Como conseguiram escapar?”, perguntou o Mestre das Armas, curioso.
“Tenho algumas habilidades arcanas,
que nos permitiram fugir!”, respondeu Kariel.
“Meus parabéns! Aquelas bestas são
bastante intolerantes a nossa presença! Esperamos em breve reunir um exército
envolvendo todas as Casas para extirpar de uma vez por todas aquela ameaça de
nosso território! Pena que existe muita politicagem para tomar esta decisão.
Por mim, iria amanhã mesmo lutar contra aquelas criaturas! Mas... se conseguiram
escapar, é sinal de que têm algum potencial. Gostariam de juntarem-se à Casa
Nanitarin?”, convidou o drow, pensando em novas aquisições.
“Não nos leve a mal, senhor...”,
respondeu Kariel, “agradecemos o seu convite, mas no lugar de onde viemos
sofremos com muitas reviravoltas e traições. Por isto, somos muito cautelosos
sobre em quem podemos confiar!”
O drow franziu as sobrancelhas e parou por um segundo.
“Lamento ouvir isto. Fiquei desapontado
pela recusa, mas irei respeitar as leis e não os jogarei no calabouço. Estão
livres para partir. Se reconsiderarem o convite, me procurem! Agora vão!”,
ordenou em tom desagradado.
Os heróis fizeram uma vênia, inclinando levemente o corpo e
deixaram a sala, escoltados. Os soldados devolveram seus pertences
e os infiltrados começaram a andar em direção da praça que
haviam visto.
“Aquele Rizzen Nanitarin não gostou
muito quando recusamos!”, comentou Limiekki.
“Talvez haja represálias. Temos que
ficar atentos e perseguir nosso objetivo o mais rápido possível”, colocou
Magnus.
“Hei! Hei!”, bradou Bingo para
os colegas. “Olhem lá! É aquela casa cheia de quadros que vimos quando
estávamos passando!”
“Uma galeria! Um lugar dedicado à arte.
Vi delas somente em grandes centros como Águas Profundas e Portal de Baldur!”,
comentou o prof. Danicus. “Não esperava que os drows apreciassem a arte!”
“Sugiro nos dividirmos e procurarmos
por informações e oportunidades úteis à nossa missão!”, comentou Kariel. “Vou
até aquela galeria. O lugar é movimentado e pode haver alguém influente. Além
do mais, estou curioso a respeito.”
“Irei com você!”, ofereceu-se
o prof. Danicus.
“Vi uma taverna. Nestes lugares costumam
haver boas informações!”, disse Arthos, que tinha em mente também outros
interesses.
“Taverna? Opa! Vou contigo!”,
empolgou-se Limiekki.
“Eu irei caminhar pelas ruas!”,
colocou Mikhail. “Os outros podem vir comigo, se quiserem!”. Magnus,
Bingo e Iskapoft concordaram em ir com o elfo clérigo.
“Nos encontramos aqui novamente, após
a exploração!”, marcou Kariel.
E assim a Comitiva da Fé espalhou-se pelas ruas da praça do
distrito de Nanitarin.
A Sala de
Concerto
Mikhail,
Magnus, Bingo e Iskapoft circularam pelas ruas. Curiosamente,
não viram nenhum escravo, apenas drows, que olhavam para
eles com certa estranheza. Não sabiam os heróis se pelo
fato de estarem ainda com roupas com aparência suja e
desgastada, ou se pelo fato de andarem com Iskapoft.
Não viram muitas fêmeas, as poucas que puderam perceber
passaram sozinhas e distantes. Encontraram por muitas
construções dedicadas ao comércio: lojas de roupas, de
alimentos, armas. Porém algo chamou a atenção do quarteto:
uma bela construção, com uma grande escadaria de pedra
marmórea que levava a um portão amplo e aberto. De dentro
dele, escapava uma bela melodia. Como a entrada não parecia
restrita, resolveram subir os degraus e observar.
Ao entrar, viram um grande salão. Havia mesas
e cadeiras e muitos drows sentados que olhavam para um palco, onde um músico
tocava um instrumento incomum. Sobre uma espécie de mesa, vários tubos de cristal
vibravam ao toque do artista, arrancando notas que formavam uma melodia triste,
mas bem executada. Mikhail pensou por um momento que talvez uma parte da herança
cultural dos elfos ainda persistisse nos drows, dada a capacidade de compor e
apreciar a arte da música.
Alguns se viraram e fitaram os quatro que estavam
parados na porta da sala de concertos. Olharam novamente com um ar quase de repulsa,
como se eles pertencessem a um outro lugar.
“Amigos... acho que é um bom momento
para sairmos daqui e trocarmos de roupa.”, colocou Magnus.
“Vi uma espécie de loja próximo daqui!”,
comentou Mikhail. “Ainda temos bastante dinheiro e gemas conosco!”
“Não... não vamos agora, não! Esse
lugar deve ter alguma comida! Podemos comer e depois comprar as roupas”,
protestou Bingo.
“Depois vemos isso, pequeno!”,
respondeu Magnus.
“Puxa... mas minha barriga está começando
a roncar. Não pode fazer uma daquelas mágicas que fazem aparecer comida!”,
continuou o halfling.
“Não... agora não! Não vamos utilizar
estes recursos se temos como comprar alimento. Aguarde um pouco. Vamos encontrar
os demais e comprarmos as roupas. Depois arrumamos um lugar para comer!”,
disse Mikhail, silenciando o amigo.
Saíram da sala, mas não antes de um ruído
forte sair do estômago de Bingo.
A Taverna
Arthos
e Limiekki chegaram à taverna. Não era com as tavernas
comuns em Faerûn: as mesas e cadeiras eram colocadas
na rua e os atendentes vinham de dentro de um pequeno
estabelecimento, com os pratos e bebidas nas mãos. Escolheram
uma mesa próxima a alguns drows, que conversavam animadamente.
Logo que sentaram, um drow esguio e jovem veio atendê-los.
“O que desejam?”
“Queremos beber alguma coisa. O que
têm?”, perguntou Arthos.
“Chá de restyrfa, karvarin e vinho
de ruths!”
Arthos e Limiekki se entreolharam, sem entender
nada.
“Pode me trazer este tal vinho! E para
comer?”, continuou Arthos.
“Ensopado de lagarto!”, disse
o garçom.
“Então pode trazer!”
Antes de atender o pedido, porém, o jovem
olhou os dois clientes mal-vestidos sentados e falou-lhes em voz baixa.
“Não se sintam ofendidos senhores,
mas têm mesmo dinheiro para pagar a refeição?”
“Claro que sim! Estamos com nossa roupas
estragadas porque viemos de uma longa viagem!”, devolveu Arthos.
“Viagem? De onde, senhor?”, perguntou
curioso o atendente.
“Isso aí já assunto particular! Pode
ficar sossegado e trazer o que lhes pedimos porque nós temos dinheiro para pagar!”,
disse Limiekki, exibindo algumas peças de ouro.
Enquanto esperavam, os dois amigos aguçaram a
audição para ouvir o que os outros clientes falavam. Na mesa mais próxima, dois
amigos conversavam sobre uma aposta. Pelo que puderam apurar, havia uma arena
de arcanos no distrito de Phaundakulzan e um deles estava recomendando o outro
a apostar. Poucos minutos depois, o garçom retornou com o pedido. Enquanto colocava
os pratos na mesa, observou algo, um símbolo nas roupas dos dois clientes, que
lhe chamou a atenção.
“Perdoem-me novamente a minha curiosidade,
senhores, mas que símbolo é este que ostentam? Não parece o de nenhuma de nossas
Casas!”
“E não é! Este era o símbolo de nossa
antiga Casa, que foi extinta. Viemos de outra cidade!”, respondeu Arthos.
“De outra cidade! Nunca atendi ninguém
de fora de Undrek'Thoz. Agora entendo o que falaram sobre viagem! Deve ter sido
uma jornada e tanto!”
“Sim! As cavernas fora daqui são muito
perigosas! Mas, meu jovem, mudando de assunto...é verdade que existem arenas
de magos no distrito de Phaundakulzan?”, perguntou Limiekki.
“Sim, senhor! São arcanos?”
“Não, mas gostamos de apostas! Onde
fica este distrito?”, perguntou.
O jovem apontou uma direção. Na superfície,
chamar-se-ia o Oeste, mas em um lugar onde o sol nunca foi visto, tais pontos
cardeais simplesmente não existiam.
“Dizem que não possuem mais Casa. Pretendem
entrar em alguma? Pelas armas que portam poderão ser da Fyvrek'Zek.”, prosseguiu
o falante drow.
“Porque? Esta Casa é de guerreiros?”,
perguntou Limiekki.
“Sim, senhor. São os mais ferozes e
hábeis! O distrito Fyvrek'Zek fica naquela direção!”, disse, apontando.
“No momento, temos é que conhecer esta
cidade. E uma biblioteca? Existe alguma?”, questionou Arthos.
“Não aqui. A única aberta ao público
fica em Mezrylornyl, o distrito mais próximo, seguindo a rua do outro lado da
praça!”
“Obrigado. Qual é o seu nome?”,
quis saber Limiekki.
“Merinid Nanitarin, senhor!”
“Merinid, traga-nos a conta por favor.
E uma garrafa de vinho extra para levar.”, pediu o mateiro.
O jovem trouxe um pedaço de papel. Os dois
amigos ainda ficaram sentados por um tempo, bebendo e comendo a exótica
comida. A despesa era de dez peças de prata, mas os dois deram ao jovem, ao final
da refeição, cinco peças adicionais, pelas informações recebidas,
o que deixou o Merinid bastante contente e surpreso.
“Vamos encontrar os outros. Já podem
ter descoberto alguma coisa também!”, disse Arthos, levantando-se da mesa,
indo em direção da praça principal do distrito.
A Galeria
Kariel
e Danicus entraram na construção de portas largas que
era a galeria. Era um cômodo espaçoso e bem iluminado,
porém a luz aqui, porém, era diferente.
Em vez de esverdeada, era branca e vinha de cristais
imbuídos com magia fixados nas paredes. Talvez
a mdança servisse para não influenciar
as cores das obras. Havia muitas pinturas e esculturas.
As primeiras ilustravam paisagens das cavernas e retratos,
todos em tons escuros que ora pareciam tristes e melancólicos
e outras vezes davam uma sensação de seriedade, força
e frieza, principalmente nos rostos de personalidades
locais. As esculturas mostravam aranhas e drows montados.
Os drows, que freqüentavam aquele lugar, possuíam roupas
luxuosas e era possível ver uma quantidade maior de fêmeas
do que as que circulavam nas ruas. Danicus, que observava
atentamente um quadro, comentou.
“De onde eles retiram estas tintas?
Aqui não existem árvores ou frutas para produzir estes matizes!”
“Eu diria que devem vir de minerais.
Ele conhecem bem este tipo de material aqui!”, respondeu Kariel. O mago
olhou para um espectador, um drow de aparência nobre, usando um luxuoso robe
de seda negra e branca, que formavam o padrão de teias. Resolveu aproximar-se.
“Desculpe minha interrupção, senhor,
mas a qual artista pertence esta obra? Gostei muito deste trabalho.”
“Não sabe? De onde veio? Do distrito
de Fyvrek'Zek?”
“Não sou daqui. Sou recém chegado de
uma cidade distante, chamada Maerymidra!”
“Maerymidra? Você está me dizendo que é de
fora de Undrek'Thoz? Já se reportou a milícia?”, perguntou o drow, intrigado.
“Sim. Falei com Rizzen Nanitarin ao
chegar!”.
“Isto é muito raro. Não costumamos
ter visitantes. O autor desta obra é Berg’inyon Nanitarin. Esta coleção
já está há algum tempo em exposição, mas a anterior estava mais inspirada. Creio
que ele está perdendo a criatividade!”.
“De onde venho, não havia tal refinamento!
Mas mencionou o distrito de Fyvrek'Zek... por que achou que eu vinha de lá?”
“Pelo fato de não conhecer este artista
famoso. Os de Fyvrek'Zek não apreciam a fina arte. São apenas tolos obcecados
pelos combates. Montam arenas e apostas. Pelo menos são bons fabricantes de armas
e estão inclinados a ajudar nossas Casas contra o inimigo em Drezz'Lynur!”
“E estas Casas têm uma liderança? Em
Maerymidra tínhamos uma Casa mais poderosa que comandava a cidade!”
“Sempre existiram disputas ferozes,
mas chegamos ao consenso que elas somente nos enfraquecem perante nossos inimigos.
Então uma aliança de paz permanente foi assinada e permitiu-se o livre acesso
dos habitantes de Undrek'Thoz a todos os seus Distritos. Eu mesmo não sou daqui.
Meu Distrito é o de Trun'Zoyl'Zl. Mas...não perguntei o seu nome...”
“Meu nome é Vandrax. Sou um arcano.
Pertencia a Casa Chumavh de Maerymidra, mas minha matrona e sacerdotisas foram
mortas e não pertenço mais a nenhuma Casa.”
“Um arcano...interessante. Agora vejo
o porque do seu interesse pelas artes. Arcanos costumam ser inteligentes e prestam
atenção nos detalhes. Chamo-me Istolil Trun'Zoyl'Zl.”
“Na sua Casa a magia e a arte são apreciadas?”
“Certamente, porém não tanto quanto
eu gostaria.”, respondeu Istolil.
“Será que a Casa Trun'Zoyl'Zl gostaria
de um novo membro? Preciso de uma nova Casa, onde possa me desenvolver, mostrar
meu potencial!”, disse Kariel.
O drow bem vestido e de porte altivo deu um discreto
sorriso, impressionado com a audácia daquele estranho e maltrapilho forasteiro.
“Pode ser, mas será que possui requisitos
suficientes para pertencer a minha Casa?”
“Aceito ser testado em minhas habilidades
arcanas. Caso não sirva, nada perderão!”, respondeu o mago da Comitiva”.
“Está bem! Apresente-se no próximo
ciclo, ao meio fogo, ao quartel da Casa Trun'Zoyl'Zl. Farei uma carta de recomendação.
Aguarde um instante!”.
Istolil Trun'Zoyl'Zl afastou-se e retirou
um tubo de cerâmica negra de uma bolsa que guardava consigo. Abriu e de dentro
sacou uma pena e uma folha de papel. Escreveu algo e veio em direção a Kariel,
entregando o manuscrito.
“Obrigado!”, agradeceu o mago
disfarçado, “Poderia levar mais alguém comigo? Tenho alguns companheiros
procurando uma nova Casa!”
“Pode trazer consigo quem achar que
possui algum valor. Espero-lhe lá.”
Kariel então inclinou favoravelmente a cabeça em uma saudação
e afastou-se, retornando à companhia do prof. Danicus, que
ainda olhava com atenção os quadros.
“Quem era aquele?”, perguntou
discretamente o Harpista sênior. “Conseguiu algo?”.
“O que acha de uma carta de recomendação
para um teste de admissão na Casa Trun'Zoyl'Zl?”, sorriu Kariel, mostrando
o papel enrolado.
“Excelente!”, exclamou Danicus.
“Vamos retornar para a praça e aguardar
pelos outros!”, disse Kariel, chamando o colega para deixar o edifício.
Terminada a exploração inicial, a Comitiva novamente
se reuniu. Possuíam algumas informações para partilhar. Era a hora de tomar algumas
decisões.
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